quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Mentiras e mentirosos

Ruth Guimarães

Era uma vez um menino chamado Marco Pólo, que nasceu em Veneza , em 1254. Filho e sobrinho de dois aventureiros, mercadores que faziam negócios para os lados do Mar Negro e do Império Tártaro. Chamavam-se Nicolò e Mateo. Numa de suas costumeiras excursões foram encarregados pelo Grão Cão dos tártaros, Kublai, de uma embaixada junto ao Papa. Nessa viagem levaram tanto tempo que, quando voltaram a Veneza, Nicolò encontrou com quinze anos o filho que nem nascido era quando o pai saiu de casa. A esposa tinha morrido.

Mas a coceira das viagens não abandonou o atrevido veneziano. Voltou ao país dos tártaros, desta vez acompanhado pelo filho Marco Pólo. Mais de vinte anos ficou o moço a serviço do Kublai, que lhe admirava a inteligência viva, as qualidades de diplomata, seu conhecimento das línguas.

Marco Pólo percorreu, como embaixador do Kublai, grande parte da China Ocidental, a Insulíndia, as costas da Índia e o Golfo Pérsico.

Um belo dia voltou Marco Pólo ao Ocidente. Estabeleceu-se em Veneza e se danou a contar as coisas estranhas vistas no Extremo-Oriente. Juntava gente em torno dele, os moços, as crianças, multidões. E ele contando. Ouviam-no e, dentro em pouco espoucavam as gargalhadas.

Ele falava somente a verdade, mas foi considerado o maior mentiroso da Europa. O maior mentiroso do mundo.

Marco Pólo? E eram as risadas intermináveis. Como mentia aquele homem! E todos corriam a ouvi-lo, maravilhados. O viajante contava os casos do terrível velho da montanha, a história de povos esquisitíssimos, de olhos amendoados, de gente que apertava o pé em formas de ferro, para que não crescesse. E histórias de um bicho que fabricava fios lindos próprios para tecer.

Dentro em pouco tinham-lhe posto o apelido de Senhor Milhão.

Que imaginação! Ah! ele era o maior mentiroso do mundo. Um pândego esse homem! E como inventava coisa!

As coisas hoje estão muito mudadas. Viaja-se demais e pensa-se de menos. E até se chega ao extremo de viajar não para ver, mas para ser visto. Não para aprender, mas para esquecer. E coisas mirabolantes não emocionam mais ninguém. Já estão em todos os folhetos de turismo.

O viageiro de agora, por muito que viaje, mal chama a atenção. Para ser considerado o maior mentiroso do mundo teria que ao chegar, ao se inteirar dos acontecimentos da terra que deixou, declarasse em alto e bom som que não sabia de nada e não tinha visto nada.

Mas como?! Não sabe de nada? Gente! Aqui está o maior mentiroso do mundo.

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