Não
acusei logo o recebimento do seu livro “Os Filhos do Medo” porque precisava,
antes disso, fazer outra leitura dele, e a leitura teve de ser adiada por força
das macacoas da idade.
Foi
lido, agora em letra de forma, o que lhe deu, como dá a todos os livros, a sua
verdadeira figura.
Nada
tenho a acrescentar ao que já lhe disse a respeito dele quando o li inédito,
senão que, uma vez publicado divulga-se o merecimento que tem e torna sempre
lembrado o seu nome.
Dessa
última leitura guardo a satisfação de ter verificado que você nem uma vez,
mostrou no seu estudo o frívolo quê feminino, me contradiço no trabalho das
mulheres, mesmo das notáveis escritoras.
Vou
lhe contar um caso que tem relação com o que vem na página nove do seu livro. anota-se
do que você diz a respeito da procura dos corpos dos afogados nas águas dos
rios, por meio de uma cuia com uma vela acesa dentro. Em Pouso Alegre, que é
uma mesopotâmia onde morre muita gente afogada, empregam gamela em vez de
cuia; mas não é disso que quero falar.
Não
sei se leu um romance mexicano chamado “A Ponte na Selva”, de um autor que não
é meu conhecido, cujo nome agora não me vem. É romance moderno, bem feito e
interessante, em torno da morte de um menino que cai no rio e se afoga. Entre os
meios que lançam mão para encontrar o corpo do pequeno, figura um pedaço de
tábua posto a flutuar com uma vela acesa no centro, a qual há de parar no lugar
em que o corpo se encontrar. Não estranho que esse costume seja generalizado
porque resulta de um fato natural e averiguado. Conto o caso porque você tem
interesse nisso e talvez não a conheça.
Quando
o José esteve aqui conversamos muito e fiquei informado dos seus arranjos,
ocupações, projetos, esperanças, e satisfeito porque vai tudo correndo como
você quer.
Que
assim seja sempre através dos anos que aí vem; e sempre que se sentir contente
com a vida e tiver vontade de se expandir, como gostam de fazer todos os
contentes, escreva-me contando o que lhe acontece porque me alegra participar
do seu contentamento.
Não
tenho o que dizer dos nossos amigos e colegas a não ser que vão bem de negócios
e saúde. De letras nada sei – ando por longe já meio cansado delas, mas, por
despedida estou escrevendo um livrinho de notas sobre passagens da minha
passageira vida literária: chama-se “Manicuêra” – o que foi mandioca, ou,
restos venenosos do mani.
E
me despeço agradecendo o presente do livro e pedindo que dê lembranças minhas
ao José.
Sempre
o seu amigo velho
Amadeu
de Queiroz
São
Paulo,
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