Ruth Guimarães
A pecuária extensiva do Vale precisa de uma enormidade de terras. Dono de trinta alqueires ou cinqüenta tem um sítio, absolutamente impróprio para a criação. Fazendeiro é de 200 alqueires para cima, dono de latifúndios maiores do que alguns países europeus. A média de criação é de 30 cabeças por alqueire. Quando o pasto está eivado de capituba, ou sapituva, de barba-de-bode e cupim, ou de rabo-de-burro que vai a perder de vista, então o dado é uma cabeça por alqueire e olhe lá, que o pasto rapado não dá nem para uma.
O clássico diálogo de Jeca Tatu entre um caixeiro-viajante de casa comercial e um caipira pé-no-chão, de cigarro de palha atrás da orelha, chapéu de palha e barbicha, começa assim:
- Que terra triste e árida, sem uma árvore, sem uma planta, sem uma sombra. Esta terra não dá pelo menos milho?
- Quá sô moço, não dá!
- Não dá mandioca, não dá cana, não dá feijão?
- Não dá...
- Não dá abacaxi, não dá grama?
- Quá, não dá.
- Mas já experimentaram plantar alguma coisa?
- Uai, moço! Se plantar, dá!...
Conversa com um fazendeiro de cem alqueires, endividado até os cabelos:
- Mas por que o gado não rende?
- Falta de pasto.
- O senhor tem cem alqueires, não foi quanto disse?
- Disse, mas está eivado de sapituva.
- Por que não manda arrancar?
- Não adianta arrancar. Joga pra lá, ela torna a brotar.
- Amontoa a sapituva que ela não nasce.
- Falar é fácil. Preciso de veículos. As estradinhas estão ruins, barrentas na chuva, poeirentas no calor. Não seguram bem, estão sempre deslizando. Pedregulhar na descida não adianta. A pedra rola, porque a terra não aceita. Mandar limpar a mão e puxar com enxada, não adianta. A gente está sempre com dificuldade de camarada. Ninguém mais sabe limpar um pasto.
- Têm vindo famílias do Ceará e de Minas para as fazendas de São Paulo.
- Buscar gente em Minas, cansei de buscar. Mineiro fica um pouco e volta pra lá.
- Não encontra condições de permanência aqui.
- Não é não, não é isso não. Esse povo do mundo não tem nada pra perder.
De acordo com esse fazendeiro pessimista (quá, seo moço, não dá!...) o culpado de tudo é o governo.
- Se o governo olhasse pelo leite como olha pela gasolina, pecuarista estava feito. O que vale é alcançar o preço.
Há anos, desde o ministro Alisson Paulinelli, se escutam declarações a respeito do governo pensar em estimular a pecuária leiteira. Porque todo ano se faz um esquema de estudos para aumento, dependendo dos índices de correção a oferecer. Os aumentos sempre ocorreram no início de abril, em julho e no fim do ano. Suas Senhorias declaram aos jornais que o Brasil mais do que nunca depende dos agricultores e pecuaristas e que precisa de produção. Querem que o produtor tenha remuneração adequada. Parecem que querem manter um nível de estímulo. Não sei. Não se ouve nada a respeito nas rádios, estão mais preocupados com a Copa do Mundo de 2014. Acho que os fazendeiros idem, porque embora declarem os empréstimos insuficientes para tocar eficientemente a fazenda, muitos fazendeiros têm carro novo todos os anos, mantêm mansões dispendiosas na cidade e as fazendeiras não conhecem as vacas nem de nome.
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