Ruth Guimarães
É permitido pensar que o primeiro homem tenha comido frutos e ervas. Que tenha comido animais pequenos, insetos, mariscos e que cingisse os rins, como na história de Adão e Eva, com folhas de figueira brava ou de parreira silvestre. Quando afiou as primeiras pontas de madeira e sopesou a primeira lasca de pedra, avaliando-lhes o peso e a utilidade, passou a atacar os animais de grande porte, feras de pisada macia, soberbos leões de pelagem dourado-avermelhada, panteras e tigres, e os monstros antediluvianos, de longo pescoço, pernas pequenas, flancos altos e sólidos a modo de muralha.
E os mamutes de presas fenomenais. E os grandes morcegos de asas peludas, amplas, temerosos no seu voo feito em silêncio.
Tornado animal predador tinha por vezes que abandonar o refúgio, a caverna, e passar noites na floresta.
Para se prevenir contra a fome e contra a mordida fria do vento, a ardência do sol, a chuva e a neve, o arrefecimento da temperatura em noites medonhas e nas madrugadas assustadoras do começo do mundo ainda inexplorado, o homem usava os animais por dentro e por fora: comia-lhes a carne e vestia-lhes a pele. Protegia-se também desse modo, mal e mal, dos espinhos agudos, do arranha-gato, que, naquele tempo, devia ser mais viçoso que o de hoje e muito mais doido, do juçá de certas folhas muito ásperas, do queimar da urtiga. Não devia era cheirar muito bem, enrolado em couro mal curtido.
Observando as tendências da moda, verificando que nos dirigimos decididamente para a nudez, o que realmente não sabemos é: se se trata de um progresso, ou se o homem, em que pesem os inventos aos milhares, apenas regride.
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