domingo, 28 de abril de 2013

Lições de pescaria

Ruth Guimarães 

A respeito de peixes do rio Paraíba, nós valeparaibanos só ficamos na saudade. Bom será que se lembre o que fazia as delícias dos piraquaras com suas linhadas e seu samburá. 

Com frio, como agora nestes últimos dias, não adiantava ir pra beira do rio, que era só para dar banho na minhoca. 

Mas em tempo de chuva, o peixe aparecia. Pescador não achava graça em ficar sentado no capim molhado, com aquela chuvinha criadeira, e o sereninho pela cabeça, mas o peixe estava ali mesmo, fácil de pegar, enquanto a água estivesse quente, nos meses de primavera e verão. Esfriou, sumiu o peixe, nas luras de pedra, e embaixo do mato de beira-rio, o iguapé, de belas flores lilases. 

Havia peixes que eram de profundidade: os de couro, como o surubi, o bagre, o mandi-guaçu. 

Com o vento era outra história: vento, ventania, qualquer ventinho, já não dava pra pescar. Primeiro porque a água esfriava. Segundo porque não dava para firmar a vara. E a linha bambeando, é certo que peixe grande, como o dourado, cortava a vara e se mandava no mundo. 

Setembro e outubro eram os meses de pescaria. Tempo de dar tarrafadas na água calma e de apanhar peixe às cestadas. Depois desses meses, a água ficava cheia de corredeiras perigosas, inchada de chuvas, barrenta. No fim do ano, com a piracema, a pesca estava proibida; mas de vara, podia-se pescar sempre. 

A água suja dava mandi, dos dois, mandi-chorão e mandi-guaçu, peixes de couro, bons de comer, ruins de limpar, porque eles espetam a fisga no dedo da gente. 

E também tínhamos de dar atenção às iscas. Isca de dourado era só peixe fresco, carne e rã. Carniça era de piau. Siriluia pra lambari. Já vi pegar surubi com lacraia, dessa que dá embaixo da pedra. 

Piau não era só de carniça. Era peixe de milho também. 

- De milho, coco podre, lesma, mortadela, peixinho picado, milho verde, queijo, laranja, siriluia... o que é que piau não come?

- Mas ainda existiam outros peixes, contou o pescador Francisco dos Santos, o seu Chico. Tinha timburé, peixe porcaria, tinha rabo azedo e o cachorro magro. E tinha o corimbatá, que muita gente chama só de corimba. Ah! e Piapara. E piranha, que a gente pesca com banana.

- Claro, banana. Qualquer peixe gosta, isso não é novidade. O que tem é que precisa muita sensibilidade por parte do pescador, e puxar a linha no mais ligeiro toque. O peixe chupa a isca e deixa a gente no ara veja!

- Muita gente usa uma espécie de farinha de milho e queijo de Minas, que é mais macio e de gosto bom.

- Também tem disso, o peixe escolher pelo gosto?

- Algum. Tinha quem fizesse pescaria com raízes de plantas aquáticas, lodo preto do fundo, folha velha de iguapé, tudo embolado e amarrado com linha. Dava só para pescar piapara, timburé, lambari-táboa e cachorro magro.

- E tem tudo isso de peixe, tanta qualidade, no Paraíba?

- Tem, não. Tinha. O governo mandou semear tilápia, diz que mode a esquistossomose. Não deu. Tilápia aplastrou no lodo do fundo. Só dá de pegar com tarrafada, assim mesmo pouco. Aqueles outros se acabaram. Quem quer pescar vai de pesqueiro, fazenda que era de criação de gado virou de pescaria. Não dá gosto. Só se pescam tilápia e carpas. E depois de pescar tem que pagar, senão não leva. Eh! Mundo! Estão acabando com a alegria da gente!

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