Ruth Guimarães
A ela foi imposta a responsabilidade da primeira culpa.
Todos estavam estreando: Jeová na sua primeira maldição – a serpente que por essa não esperava. Adão condenado a ingerir erva do campo, a comer o que conseguisse com o suor do rosto, a tornar à terra, pois da terra tinha sido tomado, porque era pó e em pó se converteria. Além de participar dessa sentença como criatura humana memento quia pulvis es teve a sua partezinha em separado: multiplicarei grandemente a tua dor e a tua concepção. Com dor parirás os teus filhos e o teu desejo será para o teu homem e ele te dominará. A última parte da sentença foi tão conveniente ao homem que dá para se suspeitar da imparcialidade do Pai.
Além de ter a primeira culpa, Eva deu à luz o primeiro crime, isto é, o primeiro filho Caim, com o que principiou a longa história de dor e ignomínia da Humanidade.
Essa mulher nos perdeu, outra seria a nossa redenção.
A que seria a Intercessora.
O mundo está desnorteado porque a mulher está desnorteada. Ela que sempre contou o homem como companheiro e que o apoiava e protegia, mas femininamente, como uma liana traz sombra e frescor à árvore em que se enrosca. E perfuma os troncos brutos. E floresce agarrando-se com as gavirinhas aos ramos tortos, e perfuma o ar, formando nos encontros dos galhos uns côncavos macios forrados de folhas, onde os pássaros fazem ninho.
Pois é. A mulher está desnorteada por enquanto. Ainda não sabe se desenlear do caule em que sempre se apoiou. Vemos que continua a tornar como modelares os costumes do macho. Se ele pode rolar por aí com qualquer mulher porque não pode ela fazer o mesmo com qualquer parceiro? Se ele pode fumar e beber, porque não podem as mulheres fazer o mesmo? E como chefe de seção, ela endurece a voz e a alma e se torna tão desumana quanto um feitor ou os chefetes em geral. Algumas capricham no descaramento, pensando que a liberdade consiste em fazer tudo que a sociedade complacentemente permite aos homens. Isto é, ela se permite tudo, esquecida de que à mulher compete dirigir o mundo à sua maneira feminina, forte, clara, tranqüila.
Educar. Para isso ela veio. Para educar os homens.
Desde séculos se diz que por trás de um grande homem está sempre uma grande mulher.
Eu diria que junto, não por trás.
Não se pode esquecer o exemplo de uma Marie Curie, do que ela e Pierre Curie, ambos pari passu ofereceram ao mundo. E quando se lê o comovente livre escrito por sua filha Eva, vemos que Marie jamais deixou de ser feminina, suave, dona de casa, mãe, mulher enfim. Mulher. E foi uma cientista completa. E a única criatura no mundo a receber duas vezes o prêmio Nobel, em duas áreas distintas.
Todas essas acontecências de agora dizem respeito a uma parte da humanidade, antes escravizada e sofrida, que quebrou os grilhões e saiu tontamente pelo mundo, sem preparo para enfrentar uma vida que realmente até desconhecia.
Várias gerações se passaram desde as sufragistas e os costumes ainda não se acomodaram às novas circunstâncias. Nem as famílias aprenderam a se conformar aos moldes atuais. Gerações e gerações vítimas da mudança destruíram o lar antigo, oásis da vida. Nada de compreensão, de silêncio, de altruísmo, de alegria. A violência se instala, nem homem nem mulher abdicam de direitos que se tornaram obsoletos. O homem ainda quer dominar a frágil figurinha que lhe fica ao lado rebelde, teimosa, irredutível. A mulher, ah! essas! Algumas mandonas acham que aos gritos e aos trancos mantêm a liberdade. Outras ficaram no passado, saudosas do mancebo romântico que, no dizer de Roberto Carlos, ainda leva flores à namorada. Onde os presentes, os bombons, as jóias raras e caras, a proteção, oferecer o lugar no ônibus, levantar à sua chegada, a serenata na ruazinha adormecida, o acróstico que lhe é dedicado? Essas querem essas coisas de antanho e mais a licença de fazerem quanto queiram, de procederem sem respeito aos sentimentos humanitários, vivem contra o homem, pois que os costumes favorecem o egoísmo. E assim uma grande parte das mulheres quer comer o bolo e o ao mesmo tempo guardá-lo no armário, milagre que nem Cristo conseguiu fazer. Ele pregava: “não assim no mundo de hoje, como deveria ser, homem, homem, mulher, mulher, nenhuma contrafação”. Como dizia São Martinho: cada um seja o que é, ou nunca será nada. Cada um com suas virtudes inerentes, a sua psicologia, a sua biologia bem diferenciada, cada um vencendo a seu modo, sem imitações ridículas e frustrantes.
Um resultado do caos advindo de lutas sociais e alterações no modo de viver é que a maioria das mulheres abdica do seu destino mais sagrado: ser mãe.
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