domingo, 28 de abril de 2013

E por falar em Natal...

Ruth Guimarães 

Meu amigo, o padre José Nunes, depois Monsenhor, de fala mansa e doçura na voz, conduz com muita proficiência a barca do senhor São Pedro. E porque assim acontece, o modesto padre José tem o aval da Santa Sé, ocorreu-me perguntar-lhe 

- Padre José, o senhor é católico? 

Queridos! Quisera que tivésseis visto o espanto do meu personagem – que prontamente se refez e respondeu, baixando a vista: 

- Dona Ruth, eu sou baiano. 

Assim, entre incrédulo de ouvir tal pergunta, e confirmando uma fé imperecível. 

Neste Natal, de muitas festas e de muitas compras, parece-me que o personagem, o símbolo, o Mediador, deixou de ser o Menino (como na história em geral, na tradição e no folclore) para ser um tipo caricato, um manipanço sem expressão nenhuma e sem mensagem, o que é mais grave. Que nos conta o Papai Noel? Que bons pensamentos nos inspira? Que exemplos pode dar, já que não tem história? 

Nós sabemos que a criatura só aprende por meio de histórias. 

Vejam e ouçam as parábolas, as fábulas. Porque só nos atingem as palavras. E onde estão as noelinas? 

Como se comenta a bocca chiusa que a igreja católica se sente talvez ameaçada e atemorizada com a atuação das religiões cristãs, oriunda da insatisfação de Lutero e do seu atrevido ataque em priscas eras, eu quis ver de perto a situação na minha terrinha, dada como mui católica e sede da Canção nova, evangelizadora. 

Botelho Netto
Foto de Botelho Netto
Assim, quantas são as nossas igrejas da religião tradicional, vinda da Patrística, com a origem de sua filosofia e nos grandes, como Santo Agostinho, São Jerônimo, Santo Tomaz de Aquino e outros gigantes do pensamento. Temos a matriz de Santo Antônio, subindo o morro, a matriz de São Sebastião, no centrão da cidade, a igrejinha do Bom Jesus na Margem Esquerda, a capela de São Pedro e São Paulo, nas casinhas a de São Benedito, no Parque Primavera a de Nossa Senhora Aparecida, a capela de São José na Santa Casa de Misericórdia, e da Senhora Mãe de Deus, na Canção Nova. A capela da Boa Viagem na Vila Carmem. Nove ao todo.
 
Somente da Assembléia de Deus estamos com sete edificações. Temos um Tabernáculo da Benção, uma Igreja Quadrangular, a Presbiteriana, a Batista, os Santos do Sétimo Dia, as Testemunhas de Jeová, a Brasil para Cristo, e outras. 

São trinta e cinco templos em todos os bairros e no centro um enorme, estadeando poder e familiaridade, programa de vida, com o que está na moda, familiaridade e posição social. 

Os ensinamentos com relação a Papai Noel consistem em uma negociata, uma barganha: “se você, filhinho, for bem comportado, o Papai Noel vai lhe trazer o brinquedo que você pedir.” Porque tem que ser a negociata, ainda por cima mentirosa, com um calunga sem raízes nossas, sem verdade e sem ensinamentos? 

E as religiões? 

Que lhes falta para se imporem, surgirem, brilharem, com a maravilhosa história do Menino? Como inculcar valores morais, tendo como instrumento uma mentira? 

Como exigir inteireza de nossos políticos depois de lhes termos vendido nossos votos e sermos pagos com a bolsa esmola, empreguismo ou outra porcaria qualquer? 

Ah! O Menino! Como está tão desolado, na sua caminha de palha, e nos seus trapos, quando os que lhe mentem são seus pastores, seus apóstolos, seus santos, os pais dos meninos, os quais ele pediu que deixassem vir a Ele. Pois que preferem que o substituam o calunga, o manipanço, o que não ama, não ensina, não o conhecemos, com seu gelo, sua roupa vermelha, seu gorro de pêlo, suas renas e seus berros e suas barganhas de mentira. 

Suponhamos que eu deixe mais claro o meu pensamento, se declarar ao amigo Monsenhor Nunes. Não. Eu não sou baiana. 

Há uns trinta anos um grupo de intelectuais tentou reformar o Papai Noel, inclusive mudando-lhe o nome para Papai Natal, dando-lhe outra significação e ensinando-lhe as histórias que evangelizassem. 

Claro que esta manobra não pegou. Não são esses os caminhos do folclore, e não é essa a larga estrada da fé. 

Quem sabe o meu pensamento ficasse mais claro se eu declarasse por fim ao meu amigo: 

- Não, Monsenhor Nunes, eu não sou baiana...

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