domingo, 28 de abril de 2013

Educação musicada

Ruth Guimarães 

Quem passasse no Domingo, pela quadra de Esportes, nessa tarde enfarruscada de dezembro com um solzinho abrindo a meio como um pálido sorriso, veria um espetáculo singular. Numerosas moças, mocinhas, com uniforme azul-marinho, sóbrio e até mesmo severo, amenizado pelo corte elegante e pelo bonezinho um tantinho petulante, gracioso, posto sobre fartos cabelos, soltos às costas, ou enrodilhados sobre a nuca. Seriam aeromoças? Perguntavam alguns, curiosamente . Ou polícia-feminina? 

Botelho Netto
Foto de Botelho Netto
Fossem poetas e diriam que se tratava de andorinhas, que viessem alegrar por instantes, garridamente, a paisagem. Ao lado sussurrava o velho Paraíba, talvez madrigais. A ponte pernilonga, atravessava com arrogância, como sempre, o rio. Mas não eram só as adolescentes andorinhas que chegavam. Rapazes, com o mesmo uniforme sóbrio, azul-marinho, bem cortado, chegavam também. 

Ficamos sabendo que era o dia de juventude, do Exército da Salvação, concentrado em Cachoeira, em louvor ao Senhor, congregando salvacionistas de várias regiões. Havia representantes entre outros de Suzano, do lar das flores, Blossom Home, dirigido e orientado durante anos pelo nosso velho amigo das serranias vizinhas de Cachoeira, Major Jung. Muito andei por lá, pelo lar das Flores, fazendo visitas e reportagens. Muitos alunos tive que de lá vieram, já com o ofício de tipógrafos ou marceneiros, de carpinteiros ou de pintores. Alguns mais bem dotados iam para o seminário. No Rio de Janeiro, depois de se formarem no ginásio, para serem os futuros missionários. A maior atração do lar das Flores, tirando o arranjo paisagístico, realmente admirável, era a bandinha. Ela tocava não só no lar, mas também no centro da cidade. Todos já viram, no viaduto do chá, a bandinha tocando para atrair os olhares. Diante dela, a panela preta e o cartaz: faça a Panela do Pobre Ferver! 

E por falar em banda, que magnífica orquestra de metais nos foi proporcionada nessa tarde da juventude, e ali na Quadra de Esportes! E os números vocais! E a alegria de tantos jovens, cumprindo o que acreditam ser a sua missão, a bela arremetida para Cristo! E que lição para nós, pais e mestres, para todos os educadores: a demonstração viva do que é capaz a juventude bem orientada! 

O que parece é que estamos acordando. Felizmente. Aqui e ali apontam instituições, propondo tirar as crianças da rua, e incentivar a adoção. Procurando ocupar útil, artística e praticamente essas crianças esquálidas que povoam o nosso remorso e a nossa sensação de impotência. O Projeto Guri, para falar em linguagem capitalista, pegou e está rendendo dividendos em interesse e formação de pequenos grupos musicais. Não que seja super-administrado, nem que o sustentem sumidades, mas porque responde o trato com a música, a um profundo anseio humano de partilha e comunicação, de que estamos em falta ultimamente. 

De parabéns pois os governos, o do Estado, o Federal, contanto que não sejam projetos abortados, por via da falta de manutenção, de policiamento, de probidade administrativa, em suma, de todas essas nossas lamentáveis acontecências de hoje, que freqüentam os jornais, para nossa vergonha. 

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