sexta-feira, 26 de abril de 2013

Conversinha sobre moda

Ruth Guimarães 

É permitido pensar que o primeiro homem tenha comido frutos e ervas. Que tenha devorado animais pequenos, insetos, mariscos, e que cingisse os rins, como na história de Adão e Eva, com folhas da parreira brava. Quando afiou as primeiras pontas de madeira e sopesou a primeira lasca de pedra, passou a atacar os animais de grande porte, feras de pisada macia, soberbos leões de pelagem dourado-avermelhada, panteras e tigres. Imaginamos que a primeira moda a respeito de roupa foi folha de árvore, ou quem sabe casca de bicho, nas quais se embrulhava o primeiro homem, o único pelado da criação. 

De como se inventou a cardação e a fiação, não ficou memória. A História já encontrou o Homem na posse de conhecimentos básicos, sabendo fazer o fogo, fiar e tecer, dominar os animais, trabalhar a madeira, cultivar a terra, construir, desenhar e escrever. A utilidade da roupa, agasalho ou enfeite, não foi estabelecida. E então apareceram uns profissionais, diz que estilistas, e tudo nessa área se convulsionou. Eles se arrogaram o direito de vestir e de despir as mulheres. 

Os estilistas tiveram o apoio incondicional do mulherio. Em questão de moda, as mulheres caminharam para trás, animadamente e também adiante. Dir-se-ia que por milagre abriram caminho e elas seguiram sem medo, sem pejo, sem demora, sem recuar. Não faz mal que a moda exponha cicatrizes, pneuzinhos, gordurinhas, manchas, pernas finas, pernas tortas, o umbigo - a peça mais feia da nossa anatomia e que não deixa de ser uma cicatriz. E isso em qualquer idade. Tenho uma netinha de um ano, que, nem bem fica sem roupa para o banho, desanda em corridinhas pela casa toda, nuinha. Mulher. 

Por via da aceitação total, a moda se instalou soberana, ditadora, mudancista. 

Ser mudancista é característico da moda. Ela é principalmente diversificada, diferente de si mesma, a cada dia, a cada hora, a cada local, a cada estação. 

Entre moda e folclore a incompatibilidade é infinita. O folclore é útil, repetitivo através do tempo. Constante, adaptado, jamais criativo. Jamais original. Vejam-se o vestido de noiva, o clássico, chamado. O luto e suas cores. 

A moda dos cabelos cortados revolucionou os arraiais femininos, lá pelos idos dos anos vinte. Provocou muita briga, muita querela entre casais, entre pais e filhas. O coque, também chamado piricote, e as bonitas tranças à Rapunzel, passaram a significar escravidão. Foi uma guerra. Alguma dúvida sobre quem seria vencedor, vencedoras? Todas as mulheres cortaram as bastas cabeleiras. Havia cabelos cortados à la garçonne. Muitas rasparam a cabeça, só para contrariar. 

Viria moda mais imperativa, os cabelos ondulados, encrespados de diversas maneiras, a rolo, a fogo, a eletricidade, com bobee, com papelotes. A coisa foi universal. Eram românticos os cabelos cacheados, ondulados. As melenas crespas provocaram sonetos, em alexandrinos maviosos. Os cachos vieram para ficar. Vieram? 

Pois aí estamos vendo os cabelos longos, lisos, e um sem-número de madalenas arrependidas pelas ruas. Cabelos escorridos, alisados, cordas de viola. Os processos para alisamentos tomaram conta dos salões de beleza. É a chapinha, a hidratação, a escova. E os cabelos em cascata, costas abaixo... Para variar, às vezes se mostram artisticamente despenteados, caindo nos olhos e na boca, provocando os gestos de jogar as mechas para trás a cada momento, aliás gestos faltos de higiene e de graça. 

A tendência da moda atual é simplificar. É diminuir o vestuário, principalmente o feminino, o que parece razoável em vista da ardência do clima em geral e do sol em particular. E não digo que chegaremos em regime de retorno, até a folha da parreira, porque já chegamos lá e quiçá o ultrapassamos. 

É claro que o vai-e-vem da moda não se limita aos cabelos. A mudança é pouco menos que radical. A dança das saias aí está, sobe e desce. A saia é larga, é cheia de folhos, reta, de seda, de brim, casimira, linho, leve, pesada, colorida. 

Graças a essa volubilidade, a esse eterno ir e vir, como as ondas, como as nuvens, como a fumaça, como a brisa, cá estamos novamente às voltas com os vestidos. 

No ano passado ninguém diria que as mulheres deixariam de lado as calças compridas, os jeans, tão cômodos, tão justos, fáceis de usar, bons para todas as horas, e modelando tão bem as curvas todas. Cederam lugar à seda, ao bordado inglês, às pregas, ao macio, ao colorido, ao suave. Graças ao insuportável calor lá voltaram os vestidos, que acompanham o ondular macio do andar, e acariciam cada corpo voluptuosamente. Graças sejam dadas à moda que é eterna porque volta sempre, imortal porque passageira, inextinguível porque inumerável. Ave. Anjo. Sílfide. Mulher.

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