sexta-feira, 26 de abril de 2013

Chico Buarque

Ruth Guimarães 

Ultimamente estão acontecendo algumas coisas boas na TV. Uma delas é a atenção que se está dando a astros e estrelas, de grande fama, ou de pelo menos alguns anos de Cinderela, e que estão no seu canto completamente esquecidos. E também se verifica uma volta completa, decisiva à brasilidade, ao que é o nosso caso. E isso me faz citar os festivais e um moço, que esse não está perdido no passado nosso, enganoso e morto e enterrado. É o moço Chico Buarque, para sempre moço, e a sua inolvidável Banda, que tanta gente cantou e trauteou, nas ruas, distraidamente, enquanto pensava e enquanto passava. 

Poesia do cotidiano a sua, nada de muitos vôos, nem de amor desesperado. Apenas a banda, a menina na janela, a excitada curiosidade de cidade pequena, em principal, da molecada. Entre esses moleques o nosso Chico. A letra é de poeta de hoje, cheia de profundo desencanto, muito moderno, de quem nada crê, a não ser que tudo passa. Afirma que um gosto, depois que acaba, deixa o desgosto maior, mas afinal não altera em nada a miserável da vida (é o Chico Buarque quem acha isto, eu não). Assim à moda do velho pessimista Machado que dizia: um relâmpago deixa a escuridão mais escura. 

No entanto o moço Chico tem um pessimismo sorridente, vê-se que teve na infância a vivência dessas bandinhas deliciosas, que sacodem de quando em quando, nas madrugadas das festas do padroeiro, as cidadezinhas, normalmente muito paradas e muito quietas. E porque é poeta, e porque adolesceu nessas mágoas de amor, e porque tem dessas experiências interiores e interioranas, consegue fazer vibrar o provinciano que dorme em cada um de nós. 

Ora direis! Ouvir a banda!... 

E eu vos direi: ouvir, ver e cantar! 

Pois foi essa a premiada, num festival da época, rico de tantas músicas trabalhadas, inspiradas, feitas por gente do metiê. 

Parece que foi daí para diante que ficou provada a importância de ser autêntico. Os ritmos que nos tocam são ainda os que vêm em seguimento a uma tradição que lembra Noel Rosa, e que parece extinta, mas felizmente continua. 

De todas as receitas que nos dão esperança de salvação, é a arte a mais segura. A filosofia que foi o cavalo de batalha dos antigos, muito nos ajudou a alguns, a sermos as criaturas que hoje somos. Mas a arte é mais democrática. Ela nos alcança, sem distinção de inteligência, de gosto, de conhecimentos, de modo de vida, de posição social, de idade, de vivência, de termos ou não freqüentado escolas, de sermos tristes ou alegres, de estarmos vivos ou quase mortos. Há de tudo para todos. Esse o valor novo da televisão. A fartura, a benesse, a escolha fácil, ao alcance de qualquer um, o acesso total, que a filosofia somente dá às gotas, e aos conformes. A ação televisiva nos faculta tudo isto, difundindo duas das artes, a um tempo, a Poesia e a Música, por intermédio dos compositores e dos letristas. 

Destes, Chico Buarque não poderá ser relembrado, porque jamais foi esquecido. Ele continua, como os bardos e os vates, sendo o nosso aedo, cantando brasilidade.

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