Ruth Guimarães
“Esse menino é tentado” – disse a avó,
olhando-o de lado, nem um pouco satisfeita, mas procurando defini-lo ou quem
sabe compreendê-lo. Não, ela não estava conformada com esse filho de Maria,
principalmente o menor, Paulo, aquele saci. Era de se esperar. Toda vida ouvi
falar que todo Paulo é levado. Eu bem que avisei a Maria que não pusesse esse
nome no menino. E era toda família a prever e a lamentar que esse menino levado
ainda ia dar muita dor de cabeça. Todos se preocupavam, menos o menino levado,
que cresceu em inteligência, em alegria, mas não em juízo, nem em sabedoria.
Ah! esse Paulo. Ah! esse menino! À
medida que crescia o menino foi-se tornando antipático. Primeiro, deixou de
rir, como todas as crianças. Deixou qualquer proceder de lado, não mais atendendo
às recomendações dos mais velhos. Esse menino pensa que sabe tudo, dizia a avó.
E bem no fundo do coração uma dorzinha pungia.
Vendo-se rejeitado, o menino levado quem
disse que se tornou mais delicado e mais fácil de aturar?
Então todos lhe caíram em cima e todos
diziam:
- Era tão engraçadinho. O que deu nele? Agora
é um malcriado.
Ele teve que aprender a duras penas. O sofrimento
o atacou deveras. Os outros não o quiseram. Não o aceitaram. Não se condoeram
de suas tristezas. E como todos, ele que se conformar em deixar de ser o menino
que todos censuravam mas toleravam, para ser como todos, empurrado, impedido,
triste, fingindo.
Que aconteceu com meu amigo Paulo? Que
aconteceu com o menino levado? Onde está sua alegria? Sua vida? Seu amor? Ele mesmo?
Cada gesto, cada sonho?
Se eu lhe perguntar hoje para onde foi, o que
dirá ele para justificar por que se perdeu? O que dirá do que lhe restou, do
que era, o que é ainda é do que foi? O que me dirá, com aquele riso que a todos
dominava?
Para onde foi sua liberdade? Para onde foi o
menino levado?
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