Ruth Guimarães
Os lápitas são um povo mítico, que tem como ancestral o deus-rio tessalino Peneu. Um filho desse rio, o efebo Ixion, subiu ao trono de Tessália e se enamorou perdidamente da filha do rei Denolau, a princesa Dia. Por mais formoso que fosse o mancebo, ela não se agradou dele, tratando-o sempre com a maior indiferença. O jovem rei, vendo que os olhares e as belas palavras não o ajudavam na conquista da princesa, apelou para as promessas e passou a acenar-lhe com presentes mirabolantes se ela consentisse em se casar com ele. Por exemplo o magnífico cinturão de Hipólita, cravejado de pedras preciosas.
- Eu conheço a rainha das Amazonas. Ela me cederá o cinturão, se souber que disso dependerá a minha vida.
- Como, a sua vida?
- Porque eu morrerei, princesa, de amor contrariado.
A moça apenas sorriu, sem comentar.
E o moço, insistente, continuava:
- Quero te ver vestida com os mantos de lã cor de púrpura, fiados por Arete, rainha dos Feácios, feitos com tal perícia que até as ninfas do Tmolo e do Pactolo abandonavam as águas para admirá-las.
- Eu trarei aqueles panejamentos de nuvem e de sonho, para com eles teceres as vestes de noivado.
E para os cabelos Ixion prometeu enfeites de âmbar nascido das lágrimas derramadas pelas Herlíadas, quanto do irmão foi fulminado por Zeus. E as jóias que ela teria? Braceletes, colares, filigranas, buriladas por Hefesto, o deus-ferreiro, que tinha a sua joalheria no fogo de um vulcão. E teria mais: as sandálias com asas do deus Hermes, para que ela voasse, em maravilhoso passeio pelo firmamento. E finalmente, para superar e coroar todas as coisas que ele lhe entregaria em nome do seu grande amor, roubaria para ela e por ela, a ambrosia dos deuses, para torná-la imortal.
Ixion mostrara que conhecia as mulheres.
Conquistada pelo que lhe parecia um grande amor, ou deslumbrada com as promessas, Dia se casou com Ixion. Que perspectiva, tornar-se imortal, e usar aquelas coisas miríficas, dignas de uma deusa!
Mal se casou a princesa quis ver os prometidos presentes.
- Amanhã! – dizia o marido.
Ambos se impacientavam. Ixion procurava fugir ao assunto, pois não estava nem um pouco à vontade para explicar porque não iria cumprir as suas promessas malucas. Dia primeiro aguardou por um bom tempo, depois cobrou, depois, desenganada, começou a inventivar, reprovando no marido a leviandade, as mentiras, e em si própria a credulidade. O caso teve um desfecho sinistro. Ixion atirou Dia numa fossa cheia de brasas vivas e deixou-a morrer. Tornou-se culpado, não somente de assassinato, mas de perjúrio. Tinha matado uma pessoa a quem tinha jurado proteger. E como essa pessoa estava ligada a ele por laços religiosos e sacrificava às mesmas divindades protetoras, tratava-se também de sacrilégio. Foi tamanho o horror inspirado pelo crime, que nenhum rei, em parte alguma, ousou purificá-lo, conforme o uso.
Zeus teve piedade, único entre os deuses, e o purificou, livrando-o assim da loucura que o atacou após o crime. Como agradeceu ao pai dos deuses essa nefasta criatura?
Cometeu a mais negra ingratidão. Tentou conquistar a esposa do deus, Hera, insistindo nesse comportamento abominável. Mas os deuses frustraram-lhe a intenção. Quando se abraçou ao que supunha ser o corpo da deusa, era apenas uma nuvem. Desse estranho conúbio nasceram os centauros.
Seus desta vez ficou indignado e decidiu castigá-lo. Primeiro fê-lo se alimentar com a ambrosia, o alimento dos deuses, que traz a imortalidade, para que a pena fosse não só por toda vida, mas eterna. Depois, colocou-o no Tártaro, ligado a uma roda de fogo, ao lado dos grandes criminosos. Para sempre.
Estamos plenamente na era das promessas. Milhares de Ixions percorrem as ruas com bandeiras. Vozes blandiciosas noite e dia falam macias ao nosso ouvido prometendo, tudo prometendo. Principalmente Educação, Saúde, Transporte e Segurança. E o que nos espera? Alta de inflação, aumento da criminalidade, transporte pirateado e governo além de incompetente, corrupto.
Zeus, oh! Zeus! onde estás que não respondes?
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