Ruth Guimarães
O “século das luzes”, como foi chamado, tinha antes sido violentamente positivista, materialista, realista, naturalista, entregue às ciências, e à solução imediata dos problemas, mesmo os estéticos, por vias nada metafísicas. Falava-se em invenções e descobertas. Falava-se em experimentação e artesanato. A confiança degenerou em fanatismo, não havia ideal, mas ideologia, e por fim se chegou, lá pelo fim do século, à dúvida, ao desânimo, à falência do método material para a terapia dos males. Mais uma vez a humanidade chegava ao cansaço e não chegava à solução. E nesse “fin-de-siècle”, cujas nuanças repousaram no crepuscular, em que o espiritual se transformou num refúgio e num oásis surgiram suaves meias luzes de espiritualidade e misticismo. Ao social sucedeu o individual. Ao realismo, o sonho. Ao que era nítido e cortante, cheio de arestas e de impiedade, seguiu-se o esfumado, o vago, a sugestão, o mistério, o divino. Todo o mundo ocidental cambiou para esses vagos meios-tons. O homem procurava em si mesmo, o que debalde havia buscado na sociedade.
A reação contra o materialismo começa mais ou menos em 1870. Parece que o terreno estava preparado, pois que o simbolismo se alastrou pela Europa toda, rapidamente. Filiaram-se à corrente as influências artísticas, filosóficas e críticas. Poetas, pintores, escultores, decoradores, o romântico Wagner com o aspecto lendário e mágico dos seus dramas, Schopenhauer, com a sua estética e sua ética pessimistas, influindo através de Wagner e de Nietzsche, tudo tendeu para o misticismo. Aliás, o misticismo foi uma tendência básica da corrente. O iluminismo se insinuou na vida intelectual da Europa. Surgiram, imprevistamente, vários autores esoteristas, ocultistas, cabalistas, teosofistas, os cavaleiros da Rosa Cruz, os que lidavam com a alquimia e a pedra filosofal.
Foram os prógonos do movimento, os pré-rafaelistas na Inglaterra, o romântico Ruskin, e Walter Pater. Na França, Baudelaire na poesia (Les Fleurs du Mal é de 1857, e tinha sido começado a publicar em 1841) e Barbey d’Aurevilly na prosa. Não se pode deixar de mencionar Edgar Allan Poe, o desgraçado autor de “Never more”.
Então o mundo tomou decididamente o rumo da espiritualidade e seguiríamos, ao que parecia, anjos e santos, pelas sendas luminosas. E foram a alma e o céu, o amor e a bondade, na Literatura e em tudo o mais.
Essas coisas aconteceram uma e muitas vezes antes. Essas coisas acontecerão muitas e muitas vezes, nesse rebanho indócil que é a humanidade. Ocorrerão nestes momentos de crise hoje, e outra vez depois desta crise e outras vezes, per omnia saecula saeculorum. Qual é o motivo? Qual a intenção? Qual o destino?
Por que nos mantêm os deuses (se é que existem) na mais absoluta escuridão?
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