Ruth Guimarães
Falei sobre a congada na semana passada, mas ainda sobraram algumas danças deste nosso Vale, então vamos somente acrescentar:
Moçambique: Os moçambiqueiros usam uma fita de seda, partindo dos ombros e prendendo-se à cintura, e calças brancas presas à altura dos joelhos por uma correia estreita de couro onde penduram guizos. Vestem-se de branco e trazem todos um pauzinho roliço, de madeira dura e clara, na mão. A primeira coisa que chama a atenção no grupo de moçambiques, como também são chamados, é a ausência de instrumentos. Bem, há um instrumento: um grande tambor de pele bem esticada, em cuja parte posterior é amarrada uma corda de viola, para aumentar a sonoridade das batidas. Essa corda é chamada "chiador". E a música é obtida da maneira mais original, mais viva, mais deliciosa do mundo, com o canto e o tinir das campainhas, ao movimento dos passos de dança. A cada evolução, os pauzinhos roliços, chocando-se uns com os outros, marcam o compasso. Por mais que os moçambiques pulem e volteiem jamais perdem o ritmo.
O moçambique é muito frequente em Aparecida do Norte em um lugarejo dos arredores de Aparecida, chamado Bom Jesus do Putim, em Cunha e Campos Novos e em São Luís do Paraitinga. É chamado moçambique em Aparecida e macumbique, em Cunha. Trata-se de dança coletiva, dançada em festas religiosas, diante das igrejas, sob arcos de bambu, enfeitados com papel de seda de todas as cores. Tem inúmeras evoluções, mais de trinta, com nomes característicos: "capoeira", "esperar em cima da cabeça", "quatro pontos", "bater trancado", "estrela do norte" etc. Começa com uma longa litania, parecida com o baixão do cururu, da zona oeste paulista, seguida de uma espécie de diálogo cantado, isto é, de solos e respostas alternadas, entre o mestre que dirige o moçambique e o coro formado pelo conjunto de moçambiqueiros em fila, chamado simplesmente de "companhia".
A hierarquia no moçambique tem o seu ponto alto com o mestre que dirige as evoluções com um apito; vem em seguida o contramestre. Os outros são chamados "o pessoal da fileira". Tem ainda um tocador de tambor e o porta-estandarte, e por último, um rei, mais ou menos inexpressivo que se limita carregar o cetro e que nem dança.
Cateretê: Também chamado de catira, ou chiba, é dança de roda, executada com batidas de pés, sem que o dançado saia do lugar e com acompanhamento de palmas. Dançam homens e mulheres. O bizarro compasso marcado com palmas e pés é alternado com o canto em coro. Não tem época especial, nem trajes típicos. É dançado em qualquer festa familiar, aniversário ou casamento ou nas festas juninas, geralmente na zona rural, nos arredores de todas as cidades paulistas do Vale.
Cana verde: É também dança de roda, com os característicos da caninha verde portuguesa. Dançam-na homens e mulheres, em bamboleios de um e outro lado, e o canto é um desafio, onde todos os dançarinos da roda têm oportunidade de mostrar o seu engenho de repentistas. Ocorre em qualquer ocasião festiva, independentemente das festas de igreja.
Jongo: É a mais misteriosa das danças valparaibanas. De evidente origem negra, participa de religiões africanas e tem muito que ver com magia. É dança de terreiro, executada ao som de instrumentos de percussão: tambor ou tambu e atabaque. Dançam pares ou indivíduos isolados.
No decorrer da dança bamboleada, dão-se umbigadas uns nos outros. A exaltação mística é enorme. Na letra da música soturna perpassam "pontos" amarrados de magia. Há jongueiros que não consegue desatar o "nó", cantando não pode se retirar da roda de jongo, nem sequer parar de dançar, sem que o outro consinta. E não é que não possa, por uma questão física. Não pode, literalmente falando, porquanto está "amarrado".
O jongo é dançado em qualquer época festiva, ou em qualquer sábado comum, por homens, mulheres negras, quase sempre velhos.
Quadrilha: Não passa de uma deturpação da quadrilha francesa, com os nomes deformados da maneira mais engraçada possível. Em todos os bailes da zona rural é infalível, principalmente nas festas juninas.
Dança de São Gonçalo: É uma variante do cateretê, dançada do mesmo modo que aquele, com igual acompanhamento de bater de pés e mãos e canto. Entretanto tem caráter religioso, ao passo que o cateretê é absolutamente profano. Dançam-na exclusivamente na festa de São Gonçalo do Amarante. Em São Luís do Paraitinga. Dois violeiros antigamente tocavam diante do altar, quando era permitida a dança dentro das igrejas, coisa agora proibidas pelos padres.
Essas são todas as danças populares do Vale, com tendência muito pronunciada para o desaparecimento.
Apesar de alguma literatura publicada a respeito, principalmente por Alceu Maynard Araújo, o dono das danças populares de São Paulo, ainda é pouco o que está registrado.
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