quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Junho

Ruth Guimarães

Antigamente, quando se soltavam balões, toda gente gritava quando os via: Olhem o balão, lá em cima. Como é belo! Mas ninguém gritava: Olhem as estrelas! Ninguém fazia caso delas. Eram tão banais as estrelas! Quem se incomoda com o que permanece?

Se vivêssemos quanto bastasse para vermos as estrelas se apagarem, elas pareceriam mil vezes mais belas. Depois de mortas. E teceríamos ditirambos às estrelas.

Que medo temos da morte! Como a enfeitamos com palavras retumbantes, com o rufar dos tambores, com bandeiras e condecorações, com urnas de luxo e mármores de Carrara.E títulos e saudades e lembranças e flores.E o comedido falar e o evidente respeito, a roupa sombria do luto, a missa de sétimo dia e a notícia no jornal.E a coroa e o epitáfio.E com que entonação falamos dela! Dar-se-á que nos parece menos horrível se a chamamos heróica? As nossas palavras também passam.Como nós, como os balões, como as estrelas.

O que tememos? Dentro da morte está latente a vida.

Só a morte continua e perpetua. O nosso destino é de renovação e de ressurreição. Quando nos enterrarem, do nosso corpo roído de vermes brotarão floradas. Não estaremos belos para sermos vistos, é certo, mas serão belas as flores em que nos transformarmos.

Quem sabe, se através de ignotos e sucessivos avatares seremos algum dia uns poucos átomos de estrelas?

O sol está perto e empana o brilho das suas irmãs mais belas.A bondade, a indulgência, o perdão, são outras tantas estrelas. Ofusca-as o sol da nossa vida exuberante.Queremos conhece-las?

Esperemos!

Esperemos fazer-se noite em nossa vida.

Um balão é bem maior do que as estrelas.E esses olhos que contemplamos enlevadamente são bem mais luminosos.

Mas existe a distância?

Mas não existe a distância?

Queremos ser estrelas, mas não passamos de um balão. Talvez porque nos enchemos muito de fumaça...

Ora direis: Ouvir estrelas? Somente os poetas ouvem estrelas.Nós não as ouvimos.Prendem-nos a atenção os balões de papel enfunado e as vozes dos palanques.

Houve Um que nos disse verdades eternas, e também não O escutamos.

Que importa que nos digam verdades eternas?

Deixamos para lá as estrelas e contemplamos enamoradamente cada balão que sobe.

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