quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Coisas do Vale - a mandioca

Ruth Guimarães

A lenda da mandioca, ou mani, dos indígenas, é completamente desconhecida no Vale do Paraíba. Consta somente de livros escolares de primeiro ciclo. Porém, a técnica de plantar, colher, os processos do fabrico da farinha, da moagem em moinho rústico - mó de pedra tocado a água, ou o monjolo de madeira -, a torrefação em fogo brando de lenha, a feitura do beiju, tudo segue as técnicas dos nossos selvagens, veri­ficadas em outras regiões brasileiras, onde a influência ameríndia é maior. Vê-se ali que a mandioca, reduzida a farinha, é a base da ali­mentação como o trigo o é para o europeu: o seu pão de cada dia. O sertanejo faz com ela os mais variados pratos: o bolo, o cozido, apro­veita-lhe a raiz, as folhas, o talo, os brotos. É a macaxeira, a man­dioca-doce, ou aipim dos fluminenses. A mandioca brava. Maniçoba com macaxeira é um guisado do meio-norte, feito com mandioca, folhas de mandioca, caule da mandioca, raiz da mandioca, e mais: camarão moído, carne de aves ou de caça e pimenta pra valer.

Vendedor de beiju - Aparecida - SP
foto de Botelho Netto
O beiju, uma espécie de lâmina doce, pururuca, enrolada, feita de massa da raiz da mandioca, ainda hoje é vendido nas ruas das peque­nas cidades, em latões, sobre carrinhos de madeira, e anunciado ao som de matracas.

Cândido Mariano da Silva Rondon recolheu entre os Parecis a lenda de mani que é, resumidamente, assim: Um pai amava o filho, des­prezava a filha. Esta, desgostosa, pediu ao pai que a enterrasse no campo de plantações. Nasceu uma planta, viçou. Arrancada, mostrou raí­zes comestíveis, que serviram de muito para a alimentação da tribo. Era a mandioca.

Também recolheram lendas de mani Couto de Magalhães e Artur Ramos. Dizem os estudiosos que a lenda encerra uma característica das antigas religiðes asiáticas: atribuir a um deus o ensino de práticas de sobrevivência, pois que a menina Mani foi deificada.

A mandioca, além de comida é bebida. Os índios faziam dela o cauim, assim como do milho. Restou do aproveitamento do caldo da man­dioca brava, ou manipuera (mani = mandioca e puera = venenosa), o tempero chamado tucupi, misturado a pi­menta.

Um dos grandes pratos típicos do Norte é o pato com tucupi. A manipuera ou manipueira, onde está o elemento mani, é venenosa, porém o sertanejo conhece a maneira de isolar o veneno.

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